Portugal fabrica biodiesel com 10 vezes mais óleos alimentares usados importados que nacionais. Por isso mesmo, a ZERO apela a um menor desperdício e maior transparência, sustentabilidade e acção ao nível dos biocombustíveis no País.

Segundo os dados da ENMC – Entidade Nacional para o Mercado de Combustíveis E.P.E., em Portugal, no ano de 2015 cerca de 34 mil toneladas de óleos alimentares usados (OAU) foram convertidos em biodiesel, correspondendo a cerca de 11% de toda a matéria-prima utilizada para este fim. Porém, apenas 1.670 toneladas tiveram origem nacional, um valor muito inferior às 23 mil toneladas oficialmente recolhidas em Portugal por empresas licenciadas para o efeito, segundo informação dada pela APA – Agência Portuguesa do Ambiente, não sendo claro o destino da restante quantidade de OAU, que transformada, representaria economicamente mais de 16 milhões de euros.

Em 2016, de acordo com os dados provisórios de produção de biocombustíveis, constata-se que, embora tenha ocorrido um incremento na quantidade de OAU de origem nacional para as 10.600 toneladas, esta corresponde somente a cerca de 46% do que foi recolhido em 2015, continuado a importação com valores muito elevados, próximos das 100 mil toneladas/ano, passando a ter um peso de cerca de 40% na matéria utilizada para produção de biocombustíveis.

Em síntese, geram-se cerca de 58 mil toneladas por ano de óleos alimentares usados gerados em Portugal, recolhem-se cerca de 22 mil toneladas, sendo as restantes 35 mil desperdiçadas, principalmente através dos esgotos domésticos. Porém, destas 22 mil toneladas, só 10 mil foram utilizadas para produção de biodiesel em Portugal (a utilização privilegiada dos OAU), admitindo-se que as restantes 12 mil tenham sido exportadas. Ao mesmo tempo, o nosso País importou 100 mil toneladas, isto é, 10 vezes mais que a quantidade de origem nacional.

A situação relativa à gestão dos óleos alimentares usados e da sua incorporação no fabrico de biodiesel é assim no mínimo estranha. É necessário cumprir metas estabelecidas pela União Europeia, mas verifica-se uma incapacidade de recolha dos óleos alimentares usados e os preços de mercado levam a movimentos incompreensíveis destes resíduos, dado que em parte são exportados, obrigando a um esforço acrescido de importação para suprir as necessidades da indústria de biocombustíveis, sem que os impactes daí resultantes sejam devidamente avaliados, podendo mesmo haver um saldo ambiental negativo entre emissões de gases com efeito de estufa produzidas pela circulação destes resíduos e as emissões que são alvo de supressão por via da incorporação como biocombustíveis.

Em Portugal, decorrente da legislação em vigor, as entidades que incorporem combustíveis no mercado para consumo final no sector dos transportes terrestres, estão obrigadas a contribuir para o cumprimento das metas de incorporação de biocombustíveis.

Segundo os dados da Direcção-Geral de Energia e Geologia, no ano de 2015, as 362.799 toneladas de biodiesel produzidas em Portugal superam as 361.029 toneladas de biodiesel incorporadas no gasóleo, resultantes da transformação de óleos virgens, nomeadamente colza, soja e palma, e matéria-residual onde se inclui a gordura de origem animal e os OAU. Assim, a indústria portuguesa é excedentária na produção, com valores superiores às necessidades anuais. Contudo, a informação disponível não é clara quanto à origem da totalidade desta matéria-prima utilizada na produção de biocombustíveis.

A Directiva 28/2009/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de Abril de 2009, introduziu a obrigatoriedade de os Estados-Membros assegurarem que, em 2020, a quota de energia proveniente de fontes renováveis, represente pelo menos 10% do consumo final dos transportes terrestres até 2020. Não ainda uma contribuição relevante dos veículos eléctricos alimentados por fontes de electricidade renovável, a contribuição principal até 2020 terá que vir principalmente dos biocombustíveis.

Portugal, com a transposição da Directiva para a ordem jurídica interna pelo Decreto-lei n.º117/2010, de 25 de Outubro definiu metas intercalares, de 7,5% para os anos de 2015-2016 e 9% para 2017-2018. Em 2015, segundo os dados da Direcção-Geral de Energia e Geologia a meta de incorporação energética de biocombustíveis foi de 7,4%, ligeiramente inferior ao programado.

Para evitar o aumento do preço dos combustíveis em 2017, em sede de Orçamento do Estado, a meta de recurso a biocombustíveis (com preço mais elevado que o gasóleo e gasolina tradicionais) manteve-se nos 7,5%, não se passando para os 9% previstos. Havendo necessidade de cumprir os objectivos fixados em legislação europeia, é fundamental o Governo clarificar qual a trajectória até 2020, quando a meta a cumprir for de 10%.