O sector da reabilitação urbana está na agenda política e económica, os especialistas nesta matéria proliferam em todo o País mas ainda há muitas barreiras a derrubar. E uma delas pode passar por “um novo tipo de intervenção no associativismo empresarial” deste sector, como defende o director-geral da Renascimóvel, César Neto.

Numa altura em que a Reabilitação Urbana se torna bandeira de políticos, empresários e de um sector a precisar de ser dinamizado (construção), existem alguns nichos de mercado que poderão representar grandes potencialidades de mercado, como sejam os proprietários dos imóveis, as instituições de carácter social e as obras de reabilitação urbanas abandonadas por empresas insolventes.

O director geral da Renascimóvel explicou à Magazine Imobiliário que a reabilitação como negócio “é transversal nas áreas de intervenção e envolve todos os actores do mercado” mas a “dificuldade notória do investimento público e a falta de consenso sobre a sua importância na dinâmica económica constitui uma enorme restrição, que deve ser compensada com outras iniciativas”.

Neste ponto faz uma ressalva para o papel do Estado que deve “ajudar a motivar quem se dispõe a investir”, devendo, para o efeito, “corrigir as dificuldades administrativas nos seus processos, equilibrando a fiscalidade e exercendo bem o papel de regulador, minimizando os ilícitos decorrentes das zonas de sombra”. Na sua opinião, “esta inegável realidade e os factores psicológicos tão característicos dos portugueses (o nosso fado), inibem os investimentos privados”.

No entanto, no meio do optimismo, embora ainda que contido, que já se começa a sentir na economia portuguesa, há um aspecto que parece preocupar os players da reabilitação. Como César Neto esclarece, essa preocupação prende-se com “o elevado valor dos registos contabilísticos de grande parte do património imobiliário. Não só na banca e nas grandes empresas. É com toda a certeza, um dos factores limitativos de uma maior velocidade de recuperação do sector, que em circunstâncias normais representará um quinto do PIB nacional e um sexto da empregabilidade potencial”.

O que falta, então, colmatar na reabilitação urbana? Falta essencialmente “a convicção de que os ciclos económicos e do imobiliário não terminaram”.

César Neto considera que “os governantes com uma crónica ausência de visão estratégica desperdiçam um importante factor multiplicador da economia, de acção imediata e com grande influência na redução do desemprego. E não valer apenas o argumento de que os recursos financeiros são escassos. A maior parte das iniciativas de organismos institucionais e públicos ou da sua esfera, nestas áreas, são feitas sem uma gestão criteriosa dos recursos não financeiros”.

Aliás, basta acompanhar as plataformas digitais de divulgação dos concursos e dos convites, para se constatar que grande parte desses concursos são “suspensos, adiados, corrigidos ou esclarecidos”.

Adianta mesmo que “as verbas são consignadas pelas entidades promotoras, mas com base em projectos deficientemente preparados: porque não foram visitados os locais e se projectou no “atelier”; porque a empreitada não se adequava às necessidades; porque os projectos são deficientemente elaborados; porque há desentendimentos que não foram previamente sanados entre as Administrações Centrais e Locais, ou porque parte da legislação dos contratos públicos carece de ajustamentos à realidade”.

Acrescentando ainda que é “convicção também dos detentores e ou gestores das carteiras de património e dos proprietários individuais, de que ‘o tempo é dinheiro’ e a obsolescência e degradação física dos imóveis é progressiva”, pelo que “não entendem as intervenções, como um investimento que poderia e deveria ser reprodutivo aumentando as rendibilidades e melhorando o ambiente social urbano”.

É, pois, necessário fazer “descer à terra” muitas pessoas com responsabilidade no “percurso sinuoso” desta actividade. E esta “descida” deve ser feita desde as associações e confederações empresariais até aos sindicatos. “Por inércia e conforto dos seus associados, estas entidades quase sempre dominadas por grupos com carácter protector feudal e filosofias de negócio ultrapassadas, têm-se perpetuado no poder”. Não é por acaso que um relatório europeu, recente, assinala défice de gestão no nosso empreendedorismo. “Este amadorismo, para não lhe chamar proteccionismo, até nos faz relativizar os nefastos comportamentos dos sindicatos”, defende.

Perante esta realidade, a equipa da Renascimóvel apresenta-se como “defensora da renovação” e de “um novo tipo de intervenção no associativismo empresarial”. E se necessário for, acredita mesmo que devem ser “constituídos novos organismos”. Na sua opinião, “seria importante para o negócio haver debates públicos, sem rodeios, chamando pelos nomes, aqueles que no passado pouco fizeram em prol do colectivo da construção e do imobiliário”. Aliás, avança, “estaremos disponíveis para partilhar iniciativas e eventualmente liderar um movimento, que venha a propor novos horizontes para o sector”.

Não quisemos deixar de perguntar sobre o facto de estarmos a assistir a uma ‘proliferação’ dos ditos ‘novos especialistas’ na reabilitação urbana. A sua resposta foi peremptória: “Os novos especialistas na reabilitação, como designa, aproveitam as nossas lacunas. Quando não há vontade e corrigir erros e os líderes são fracos, alarga-se o campo e cria-se uma suposta legitimidade, na fuga às responsabilidades e no cometer de ilícitos. Neste nosso cantinho, todas as empresas que sobreviveram à catástrofe e até as criadas recentemente, passaram a ser especializadas em reabilitação. Os seus quadros gestores, num “click”, deixaram cair a aposta nas edificações novas e tornaram-se defensores inequívocos da reabilitação urbana”.

No que concerne à componente técnica das mesmas empresas (quando existe), explica que “absorvem num ápice o conhecimento científico e proclamam o uso de técnicas particulares adequadas à actividade. Supostamente, passam a sabem executar os procedimentos que só o estudo, a técnica, o tempo e a prática, podem proporcionar. Não bastando, os recursos humanos utilizados, sem qualquer formação, ajudam à festa e a um novo estatuto de especialistas”.

César Neto denuncia que “não há formação mínima de mão-de-obra adequada à reabilitação. Apenas se vive da boa vontade e polivalência de alguns trabalhadores nacionais e de muitos emigrantes de Leste e de África, que ao sentirem algum aforro financeiro, depressa regressam às origens. E tudo recomeça”.

Este especialista em reabilitação urbana conclui: “O nosso contacto com a realidade empresarial e a nossa experiência académica - formação e ensino, ajuda-nos a fazer pedagogia, no sentido de que o mercado imobiliário passe a ser mais eficiente, mais eficaz, mais honesto e mais profissional. Todos o desejamos, mas apenas alguns, o saberão praticar.”