A Engenharia está patente nas nossas vidas e no nosso mundo todos os dias. Não conseguimos viver sem ela. Ainda assim, os arquitectos têm maior visibilidade que os engenheiros em Portugal mas este cenário nem sempre foi assim...

O prémio Nobel da Engenharia, António Segadães Tavares, confidenciou, há alguns anos, ao director da Magazine Imobiliário, Joaquim Pereira de Almeida, que, “de uma forma geral, os arquitectos quando fazem uma obra aparecem nas primeiras páginas dos jornais, vão aos telejornais, dão entrevistas, são fotografados, enquanto os engenheiros ninguém os conhece”. Acrescentando que “essa situação não foi sempre assim” e “há quarenta anos tinham muito mais notoriedade os engenheiros que os arquitectos”.

Na origem desta menor visibilidade e notoriedade estão vários aspectos que têm contribuído para que os arquitectos sejam mais prestigiados que os engenheiros no nosso País. Na opinião do Bastonário da Ordem dos Engenheiros, o motivo mais significativo é o de “os engenheiros não serem bons comunicadores e não se preocuparem especialmente com a divulgação dos seus projectos e obras, de forma a estimular o interesse dos meios de comunicação social e o interesse do público”. Segundo Carlos Matias Ramos, os engenheiros “preocupam-se sobretudo com a procura e a criação de soluções para os problemas que lhes são apresentados, e menos com a sua publicitação”. Mas “num mundo altamente mediatizado, como é o nosso, que vive da imagem, do que superficialmente nos é transmitido, e em que, infelizmente, releva mais o que se diz, o que se promove, e menos o que efectivamente é realizado, a obra em si, a acção, o posicionamento dos engenheiros está necessariamente em contra corrente”.

Para o efeito dá o exemplo “da frequente atribuição, pelos meios de comunicação social, da autoria da Pala do Pavilhão de Portugal, em que a componente de engenharia, num projecto de enorme complexidade técnica em termos estruturais, foi determinante”. Neste caso, “o projecto de engenharia foi desenvolvido por Segadães Tavares, daí o seu justificado desabafo perante a falta de notoriedade do papel do engenheiro”.

O Prémio Outstanding Structure Award, atribuído pela International Association for Bridge and Structural Engineering aos projectos de estruturas que se destacam pela sua inovação e criatividade é internacionalmente reconhecido como o “Prémio Nobel das Estruturas”. O Bastonário recorda que “num total de 25 prémios atribuídos ao longo de igual número de anos, temos no nosso País dois engenheiros notáveis que foram merecedores deste prémio, sendo Segadães Tavares um dos dois contemplados”. O outro prémio atribuído a Portugal distinguiu José Mota Freitas, pelo projecto da Igreja da Santíssima Trindade, em Fátima.

Contudo, “apesar de a Engenharia portuguesa já ter recebido dois prémios, um feito alcançado por pouquíssimos países europeus, esse facto não é relevado pela comunicação social. Sendo que, dada a dimensão de Portugal e os investimentos realizados no nosso País, incomparavelmente inferiores à maioria dos territórios europeus, aumenta significativamente o valor destes prémios alcançados por Portugal e por estes dois profissionais de Engenharia de excelência. Ainda assim, a Comunicação Social, meios privilegiados de informação pública, deram de tal facto conta à sociedade em pouco mais do que notas de rodapé. Estes critérios, que ditam o que é ou não noticiável, o que é ou não relevante que a população conheça, são, para nós, Ordem dos Engenheiros, altamente discutíveis e, muitas vezes, incompreensíveis”, enfatiza Carlos Matias Ramos.

Na prática, o que se verifica é que “a engenharia, disponibilizando os seus produtos e bens de forma a serem facilmente usados por todos os cidadãos, perdeu visibilidade social. As soluções de Engenharia tornaram-se de fácil acesso, tendo a sua existência passado a ser encarada por todos como algo intrínseco, de presença esperada, somente se notando a sua existência quando esses produtos ou bens não funcionam”, afirma.

Segundo Carlos Matias Ramos, esses produtos passaram a ser considerados como “uma commodity, dado que são obtidos sem grande dificuldade por quem os utiliza. Ninguém valoriza a forma como, por exemplo, a água e a electricidade chegam às casas das pessoas com garantia de satisfação das suas necessidades, na maior parte das vezes sem interrupções do serviço, e nem tão-pouco as soluções de engenharia, com grande complexidade, que foram utilizadas para atingir esse objectivo. Basta abrir uma torneira ou ligar um interruptor e o “problema” está resolvido”.

Esta constatação acontece tanto na criação de soluções de infra-estruturação com vista à satisfação das necessidades básicas da população, como em obras e soluções altamente complexas, onde, não raramente, o nome do engenheiro é “apagado”.

Por isso o Bastonário lança uma questão para reflexão: “Já alguém pensou o que seria o nosso mundo e a nossa vivência em sociedade sem a intervenção da Engenharia?” Carlos Matias Ramos considera que “seria bom que os cidadãos, e necessariamente os políticos, se detivessem, pelo menos durante dois minutos, neste raciocínio. Talvez se apercebessem das dificuldades que teriam em todos os seus movimentos diários se a Engenharia lhes falhasse”.

Jornalista: Carla Celestino

Foto: www.visitportugal.pt/ Pavilhão de Portugal